Sossego
A maioria das pessoas equaciona sábado à noite com farra de algum tipo fora de casa. A banda Cidade Negra tem inclusive uma música que fala sobre isso, bastante animada. Nada contra sair sábado à noite, já fiz muito isso e acredito que farei de novo ainda muits vezes.
HOJE, no entanto, estou mais que feliz de estar em casa, quietinha no meu quarto, escutanto papai assitir televisão na sala e de vez em quando levantar e levar até ele um copo de suco, ou chá, ou água de coco. É bom saber que ele está aqui, ao alcance do meu amor, do meu toque, do meu cuidado. Saber que ainda não chegou a hora de não ser mais possível fazer tudo isto. Essa hora que todos sabemos que vai chegar para cada um de nós, mas que está assinalada como um lembrete na pele do peito dele, naquele X marcado pela médica para guiar a radioterapia.
Mas agora, agora não tem radioterapia, nem quimioterapia, nem cabelo caindo nem fraqueza ainda, tem meu paizinho sentado na sala, calmamente vendo um filme policial, enquanto eu vigio de longe, teclando no meu quarto. Tem o sossego de estarmos aqui, em paz, neste momento. Eu não troco isto por nada.
Haverá muita saída aos sábados por muito tempo ainda, creio eu, mas não há outro lugar no mundo que eu prefira estar agora que aqui. Queria que este momento se esticasse, esticasse, por dias e meses.
O tratamento, para melhor ou pior, começa segunda-feira.
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