26.10.03




© 2003 - Ana Pinto
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Noturnos



Às vezes coisas boas nos remetem a coisas ruins. A presença de amigos queridos, que vêm de longe comemorar a vida e a amizade conosco, pode remeter à lembrança daqueles que ficaram pelo caminho, sem atender à mão estendida da amizade. Alguns lembramos com um alívio cansado, felizes de vê-los pelas costas. Mas outros causam um melancolia dolorida, sentimos a perda eternamente.

Na minha vida, deste grupo de pessoas, graças a Deus pequeno, fazem parte aquelas que me deram afeto genuíno, mas não conseguiram enxergar minha alma, a não ser de forma distorcida. Pessoas para quem a minha presença significava um paradoxo e um conflito, ao invés de um prazer e uma alegria. Uma delas, em especial, tocou fundo em meu coração, e sua falta se faz sentir forte. Mas esta pessoa tão querida, faz um certo tempo, quis resolver o paradoxo da Sue calando a Sue, ou transformando a Sue em outra pessoa. Não posso deixar de ser quem sou, ou calar o que penso. Nem mesmo por um menino gigante de fala mansa de quem tanto gosto.

Mesmo assim, depois de passar um dia adorável com pessoas ainda mais adoráveis, eu me pergunto se algum dia vou conseguir ajudar meu gentil gigante a resolver o paradoxo da Sue. E se vamos um dia poder concretizar o abraço tantas vezes prometido. Mas pelo jeito que as coisas estão, meu gentil menino de fala mansa vai passar a ser apenas um gentil e melancólico noturno, tocando gentil, suave e triste nas noites de lua cheia. Enchendo meu coração de saudade de uma amizade que não sei se jamais foi real.


A vida tem destas coisas... ela nem sempre é gentil.

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