Viagem
Quatro da manhã. Apesar da escuridão da noite, estou inebriada de luzes. Das luzes das grandes velas perfumadas dispostas de modo elegante numa bandeja à minha frente. Da quantidade de pequenas luzes da cidade que eu vejo dispostas abaixo de mim, da janela do décimo-quarto andar. O jogo de sombra e luz. As velas bruxuleiam, as luzes das antenas piscam ritmadas: 1-2-3, 1-2-3-4...
Impera um silêncio urbano, que é mais um sossego que uma ausência de som. A cidade ressona, e a chuva que me recebeu na chegada continua intermitente, sem nunca cessar de todo. A chegada da luz do dia torna a cidade um gradiente que vai do cinza-grafite do asfalto ao cinza-concreto dos prédios ao cinza-prata das nuvens carregadas até o branco forte e sem sutileza da luz. O dia e a noite entram e saem de repente, sem a despedida colorida de uma aurora ou entardecer.
É uma cidade grave, mas que não deixa de ser gentil. Não me pesa nos ombros como faz o Rio algumas vezes, mas se planta firme sob meus pés. Tem suas rudezas inconscientes, e suas ingenuidades, tem os encantos desastrados do jovem tímido, uma urbe gigante que enrubesce com a paquera descompromissada da visitante carioca.
Em torno de mim estão pessoas graciosas, e os momentos passsam suaves, com o murmurejar da chuva que cai, dos carros que passam lá embaixo, ao som de Andreas Vollenweider e Bach e Ella Fitzgerald. As amizades que fiz e revisitei aqui são sólidas como o aço e o concreto dos edificios -- e acredito que ainda mais duradouras que estes.
Predios. Carros. Gente. Lojas. Bares.
Movimento constante, de e para todos os lugares.
Sim, meus amigos, estou em São Paulo.