18.1.04




Adeus



Ela era feita do vento que elevava as almas dos místicos. Ele era feito do fogo que queimava no coração dos poetas. Quando se encontraram, as faíscas que voaram da colisão direta criaram cada uma seu universo. E eles ficaram a rodar um em volta do outro, cada um ao mesmo tempo satélite e astro-rei.

Acontece que fogo e vento não conseguem ficar muito tempo juntos sem que o fogo queime todo o vento ou sem que o vento apague todo o fogo. Logo, eles deram mil passos atrás e mantiveram uma distância segura, mas ainda assim bailavam lentamente, num compasso paralelo, um sem tirar os olhos do outro.

Mais uma vez, no entanto, as suas naturezas os traíram. O vento sopra onde quer, o fogo só existe onde há combustível que o alimente. E o fogo achou sua brasa e o vento encontrou sua elevada solidão. Ele queima mais tranquilo, sem a espora do amor dela; ela voa mais calma sem o calor do toque dele. Mas há dias em que ela lembra como era fazer voar em todas as direções as labaredas dos seus cabelos. E ela sabe que, de longe, ele lembra também da fria exaltação do seu afago.

É duro, muito duro, quando a estrada finda sem que o amor acabe. Eles sabem melhor que ninguém. E sabem – ela sabe e ele sabe – que o vento agora sopra mais quente, pois leva consigo um coração de labareda; e o fogo queima mais forte em torno do seu novo coração de vento.

A brasa, totalmente alheia, incandesce na mais perfeita paz.

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