30.8.02

[O Unicórnio e o Caçador (Final)

Ele não sabia de onde tirara forças para chegar em casa. Tinha uma sensação de afastamento, e imaginava estar com uma aparência de lunático. Achava que os filhos e a mulher gritariam de espanto ao ver a loucura e o sofrimento em seus olhos... e a luz. “Eles vão fugir de mim aos berros”, pensava.

O choque de tudo o que acontecera deixara-o anestesiado, e ele observava a si mesmo de uma distância, como se não fosse ele andando até o carro, jogando a mochila no banco do carona, girando a chave na ignição, tomando a direção da cidade. Num gesto automático, ligou o cd-player do carro. Era Mozart tocando. A música ajudou no resto do caminho.

A casa estava escura, as crianças estavam passando o final de semana na casa da avó materna. Tudo estava silencioso. Vagamente, ele se perguntou onde andava a mulher, mas um cansaço imenso o invadiu. Arrastou-se até o banheiro, tirou as roupas todas e entrou no chuveiro. Ficou lá, parado, deixando a água escorrer por uns 40 minutos. Depois enrolou-se num roupão atoalhado e caiu na cama ainda molhado. Dormiu.

Acordou com a mulher o sacudindo. “Você está se sentindo bem?” ela perguntava, meio desconfiada. Da outra dimensão onde ele se encontrava, ele olhou para a sua mulher, e ela nunca pareceu tão linda, tão maravilhosamente certa para ele. Ele olhava para ela encantado, como se nunca a tivesse visto antes.

“O que foi? Você está estranho...” ela perguntou alarmada. Ele sorriu, embevecido, e disse: “Eu amo você. Muito.” Puxou sua mulher para cima de seu corpo e a beijou. Como se fosse a primeira vez. Ela estava assustada, nervosa, depois surpresa. Havia muito tempo desde o último beijo, e ele nunca a beijara ASSIM. Quem era aquele homem que aparecia de repente de dentro de seu marido?

Depois do beijo, palavras. Ele apresentou à sua esposa tudo aquilo que ela não conhecia - sua alma - agora não um deserto, mas uma floresta onde habitava um unicórnio. Quando sentia a presença DELA, por entre as árvores, as lágrimas desciam. Por fim, as lágrimas de sua esposa também caíram, e eles passaram a noite toda se conhecendo novamente.

Um comentário:

Ana Cláudia Pupim disse...

linda historia!