24.12.04



Post de Natal 1



"Naqueles dias, apareceu um edito de César Augusto, ordenando o recenseamento de todo o mundo habitado. Esse recenseamento foi o primeiro, enquanto Quirino era governador da Síria. E todos iam se alistar, cada um na própria cidade. Também José subiu da cidade de Nazaré, na Galiléia, para a Judéia, à cidade de Davi, chamada Belém, por ser da casa e da família de Davi, para se inscrever com Maria, desposada com ele, que estava grávida. Enquanto lá estavam, completaram-se os dias para o parto, e ela deu à luz seu filho primogênito, envolveu-o com faixas e reclinou-o numa manjedoura, porque não havia um lugar para ele na sala.

Na mesma região havia uns pastores que estavam nos campos e que durante as vigílias da noite montavam guarda a seu rebanho. O Anjo do Senhor apareceu-lhes e a glória do Senhor envolveu-os de luz; e ficaram tomados de grande temor. O anjo, porém, disse-lhes: ‘Não temais! Eis que vos anuncio uma grande alegria, que será para todo o povo: Nasceu-vos hoje um Salvador, que é o Cristo-Senhor, na cidade de Davi. Isto vos servirá de sinal: encontrareis um recém-nascido envolto em faixas deitado numa manjedoura’, e de repente se juntou ao anjo uma multidão do exército celeste a louvar a Deus, dizendo:

‘Glória a Deus no mais alto dos céus,
e paz na terra aos homens que Ele ama!
’"(Lucas 2, 1-14)






Post de Natal 2



Natal é a época de lembrar quem a gente ama. Melhor que isso, é lembrar que a gente AMA. Que é capaz, mesmo com tanta coisa contra, mesmo com tantos desencontros.

Por saber que sou capaz, e feliz por me saber capaz, encaro 2005 com o coração leve. E ofereço esta canção de Natal àquele que é capaz, e não sabe.

Amo muito você. Feliz Natal.






Have Yourself A Merry Little Christmas

Have yourself a merry little Christmas,
Let your heart be light
From now on,
our troubles will be out of sight

Have yourself a merry little Christmas,
Make the Yule-tide gay,
From now on,
our troubles will be miles away.

Here we are as in olden days,
Happy golden days of yore.
Faithful friends who are dear to us
Gather near to us once more.

Through the years
We all will be together,
If the Fates allow
Hang a shining star upon the highest bough.
And have yourself A merry little Christmas now.

17.12.04

O Contrário do que se Esperava


Uma amiga veio correndo contar: você viu? Não vi. O que foi? Vai lá.

Ah, nada mais era que um Conto de Natal.

O Espírito do Natal Passado apareceu, de monóculo e barriguinha saltando da camisa apertada. Com as falhas dos cabelos deixando o couro cabeludo muito branco aparecer, ele contava uma história de como às vezes confiamos em quem não devíamos. Com respingos de Nescau por toda a expansão abdominal, o ser ectoplásmico ria-se e fazia o monóculo saltar. Livrei-me deste com uns respingos de água benta.

Apareceu-me, então, o Espírito do Natal Presente. Jovem, longos cabelos negros combinavam com os longos dedos de músico. Ao mover-se, o cheiro de 4711 perfumava o ambiente. Este me contou uma história de aventura, de como nós mesmos construímos nosso presente. Quando eu estava aconchegada em seus ombros largos, disse baixinho: lembre-se que estou aqui.

Enquanto ainda sentia o odor de sua Colônia no ar, o Fantasma do Natal Futuro apareceu. Bem, apareceu não é bem o termo. Ele surgiu como o Gato aparece para Alice, primeiro apenas o sorriso, depois os olhos. Nunca chegou a aparecer totalmente, mas deixou o desafio no ar:

"Catch me if you can!"

E é em direção a este futuro que corro feliz e apressada. Porque quem vive de passado é museu, e as pessoas que têm medo de viver. Porque, ao contrário do que se esperava, o que vi não me feriu, me deu a certeza de que o mais certo que eu fiz na vida foi me livrar de um fantasma careca e barrigudo que tem como único mérito malabarismos divertidos.

Besitos

11.12.04

Quando se chega ao ponto de perceber que não se tem mais nada a não ser a si mesma, quando se vê que nada se possui, que não há seguranças, não há o certo e determinado, aí que percebemos que estamos caminhando sobre nossas próprias pernas, numa estrada que é só nossa, e que depende de nós onde vamos chegar.

Eu escolhi a estrada da gentileza, da doçura, do carinho. Porque é agindo assim que eu me sinto melhor. Não vou aprender a me defender de quem amo, não vou aprender a agredir em autodefesa. Então – que fazer? – vou sofrer quando os que eu amo me agridem, vou sentir quando eles se fecham em autodefesa... porque por mais que eles não acreditem, não há o que temer de mim.

Eu vou ser obrigada a carregar este coração até o fim de minha vida, e ao cabo dela vou depositá-lo aos pés do meu criador. Tomara que ele ache que seja um presente apropriado, porque mais nada tenho a oferecer.


I got a name (Jim Croce)

Like the pine trees lining the winding road
I’ve got a name, I’ve got a name.
Like the singing bird and the croaking toad
I’ve got a name, I’ve got a name.
And I carry it with me like my daddy did,
But I’m living the dream that he kept hid
Moving me down the highway,
Rolling me down the highway
Moving ahead so life won’t pass me by.

Like the north wind whistling down the sky
I’ve got a song, I’ve got a song.
Like the whippoorwill and the baby’s cry
I’ve got a song, I’ve got a song.
And I carry it with me and I sing it loud
If it gets me nowhere, I’ll go there proud
Moving me down the highway,
Rollin’ me down the highway,
Moving ahead so life won’t pass me by.

And I’m gonna go there free…

Like the fool I am and I’ll always be
I’ve got a dream, I’ve got a dream.
They can change their minds but they can’t change me
I've got a dream, I’ve got a dream.
Oh, I know I could share it if you want me to,
If you’re going my way, I’ll go with you
Moving me down the highway,
Rolling me down the highway,
Moving ahead so life won’t pass me by.


Eu tenho um nome

Como os pinheiros enfileirados nas estradas
Eu tenho um nome, eu tenho um nome.
Como o pássaro que canta e o sapo que coaxa,
Eu tenho um nome, eu tenho um nome.
E o carrego comigo como fazia meu pai,
Mas vivo o sonho que ele mantinha encoberto
Movendo a mim mesma pela estrada,
Rolando comigo pela estrada
Levando-me à frente para que a vida não me deixe para trás.

Como o vento Norte que desce sibilando do céu
Eu tenho uma canção, eu tenho uma canção.
Como o pássaro noturno e o choro do bebê
Eu tenho uma canção, eu tenho uma canção.
E eu a trago comigo e a canto alto
Se me levar ao nada, irei para lá com orgulho
Movendo a mim mesma pela estrada,
Rolando comigo pela estrada
Levando-me à frente para que a vida não me deixe para trás.

E vou até lá livre…

Como a tola que sou e sempre serei
Eu tenho um sonho, eu tenho um sonho.
Eles podem mudar de idéia, mas não podem mudar a mim:
Eu tenho um sonho, eu tenho um sonho.
Ah, eu sei que poderia compartilhá-lo se você quiser,
Se você estiver caminhando na mesma direção, caminho contigo
Movendo a mim mesma pela estrada,
Rolando comigo pela estrada
Levando-me à frente para que a vida não me deixe para trás.

10.12.04

Lamento



Para quê tudo isto, afinal de contas? De que adianta?

Os amigos vão embora, os amores são imperfeitos, a felicidade é uma coisa fugidia, a idade chega, a cobrança das pessoas não cessa nunca, a vida é cheia de nãos, nuncas, não podes, impossíveis.

Eu hoje sou uma pessoa absolutamente despossuída. Não tenho mais nada. Perdi minha mãe, perdi dois grandes amores, perdi amigos que me fazem muita falta, perdi minha juventude, estou perdendo a esperança. Nada, nada mais me resta.

A não ser eu mesma e meus mortos.

23.11.04


O Outro



Tem vezes que a paixão invade, e o que se sente é mais importante do que o que se faz. Tem vezes que a carência invade, e o que se precisa é mais importante que o que se diz. Tem vezes que o medo invade, e o que se teme é maior que o que se vê.

Mas quando o amor invade, e toma conta, e preenche todos os espaços, o medo que se sente é o de ferir a quem se ama. A carência que ameaça é a que podemos não ser aquilo que o amado precisa. A paixão desbota e cai no chão esquecida, empalidecida pela imensa alegria de saber que você está aqui.

O que surge é este outro que existe independente de mim, diferente de mim, vibrando em sintonia comigo, e cuja mera presença dá a mim satisfação espiritual maior que mulheres com mais casca apenas vislumbram na paixão física mais intensa.

Não há paixão que me dê o que você me dá. Não há medo ou carência que me impeça de dizer o que eu sempre digo e que ninguém jamais te disse: minha mente, minha alma, meu afeto, meu trabaho e minha vida estão aqui, a serviço do que para mim é mais precioso que todo o ouro de Salomão - sua felicidade.

(Hoje, olhando com cuidado o post, cheguei à conclusão que a citação tinha de ser um pouco maior, pois assim pequenina não explica tudo. Lá vai mais Corção então...)

"Somos pobres do outro; como se o sangue das veias não nos bastasse e fosse urgente trocá-lo, numa transfusão quente e viva, de coração para coração. Precisamos do outro, para o fazer comum, para a obra, sem dúvida alguma; mas muito mais para o uso comum da palavra e do trigo. Precisamos do outro para construir cidades e para ouvir um disco. Para ler livros escritos, e para ter leitores dos livros que escrevemos. Para tudo; e para nada. Para andar o mesmo caminho, à toa; para estar ao nosso lado, em silêncio. Pelo calor da proximidade, pelo conforto da compreensão. Precisamos da esmola do outro; da esmola viva, dele mesmo, como é, outro e próximo.

Quando vamos andando nas ruas, no meio da acabrunhante solidão das ruas, e vemos surgir de repente entre ombros e cabeças alheias a velha face conhecida, a boa face amiga, o tempo pára e nosso coração se aquece. É bom ver o rosto do amigo; já não estamos sós. O antigo susto que desde a infância nos persegue, medo de escuro e de solidão, se desfaz quando encontramos o amigo.

Somos pobres, fundamentalmente pobres, de carne e de espírito. Pobres como as criancinhas que morreriam de fome e de medo, se o mundo não fosse para elas um jardim cheio de mãos.

(...) Bendita seja nossa pobreza, e benditos os ombros que encontramos para nos servir de muleta!"


(Gustavo Corção, A Descoberta do Outro, ps. 118/119)

1.11.04




Sonho de rosas



Hoje à noite tive um sonho. Neste sonho estava num jardim, num pequeno canteiro, com antigas roseiras. As roseiras estavam cheias de botões, mas sufocadas pelas folhas mortas, seus galhos emaranhados como por forte vento, a terra ressecada. Que dó me deu ver aquelas veneráveis roseiras abandonadas assim.

Lá fui eu, vagarosamente separei os galhos emaranhados, retirei uma a uma as folhas mortas que ainda estavam penduradas nos galhos, varri o chão, reguei, dei uma remexida na terra do canteiro, coloquei terra nova e adubada por cima. Recolhi o lixo todo, me preparava para levar tudo para um depósito qualquer, quando uma voz me avisou: “Sue, olha...”

As três roseiras – eu disse que eram três? – estavam vivas, vibrantes, desabrochadas. A mais próxima de mim, à minha direita, tinha rosas amarelas, de um amarelo tão intenso que mais pareciam douradas, umas rosas sem espinho, lisas, que abriam como pequenos cálices de ouro. As rosas pareciam me dizer “somos a Amizade”.

No canto mais distante de mim, uma roseira de rosas malva, cor de aurora. Suaves, mais miúdas que as outras, desabrochavam em pequenos cachos de manhã. Como criancinhas rosadas, estas rosas me diziam, em coro, “somos os Dons da Alma”...

No canto esquerdo, a maior roseira de todas. Ameaçadora com seus espinhos – fôra a que dera maior trabalho para limpar, como os arranhões em minhas mãos podiam atestar –, eu podia ver que, nela, o trabalho ainda não estava terminado. No entanto, sua resposta aos meus cuidados era ainda mais generosa que a das outras duas. Rosas rubras, enormes, abertas como imensos cataventos sanguíneos, me olhavam silenciosas. Não me diziam o que eram, mas quando eu perguntei seus nomes, elas apenas me perguntaram o que eu pretendia plantar no canto que estava vago, bem à minha frente.

Repentinamente percebi que havia um toco morto diante de mim. Eu olhei para a roseira-sangue, e já que ela não me dizia o que ela representava, perguntei que roseira era aquela que jazia morta ali. As flores da roseira desabrocharam ainda mais, e responderam, pesarosas: “Esta é a Paixão. Ela morreu faz pouco tempo”. Olhei para a roseira morta, e entendi a pontada que senti no peito ao olhar para aquele tronco seco. Comentei em voz alta e um pouco embargada que não tinha ferramentas para arrancar aquelas raízes profundas.

“Escolhe uma muda e deposita no côncavo que você vê em cima deste toco“, foi a resposta. Dei conta que havia uma bandeja de mudas, bem ao alcance da minha mão direita, e eram todas jovens roseiras das mais variadas cores. Intrigada, examinei todas. A que me chamou mais atenção foi uma muda que possuía uma única rosa branca.

Branca? Não exatamente. As bordas de suas pétalas tinham cores diferentes, fios coloridos em suas pontas. O centro do botão tinha este arremate em amarelo bem clarinho, e as cores iam ficando mais vivas à medida que as fieiras de pétalas se aproximavam da parte de fora, passando do laranja para o rosa-chá, para o rosa claro e o rosa profundo, chegando ao arremate de um vermelho muito parecido com a da roseira rubra. Parecia uma rosa que continha todas as outras rosas dentro dela. E o branco era de uma perfeição aveludada que me encantou, nem esverdeado nem amarelado, como algumas vezes costumam ser as rosas brancas, mas tinha o branco muito alvo das margaridas.

Silenciosamente retirei esta muda da bandeja e removi o saco plástico que envolvia suas raízes. Ajoelhei-me, depositei com cuidado aquela única rosa branca e sua pequenina roseira no côncavo da paixão morta. Uma coisa extraordinária aconteceu... a pequena muda se fundiu com a antiga raiz e começou a crescer numa velocidade espantosa, até virar uma roseira adulta. Entretanto, a rosa multicor que estava desabrochada, retraiu-se até virar novamente um botão!

Tonta, olhei para as rosas-sangue numa pergunta muda. A resposta veio num doce murmúrio interior:

“Você escolheu o Amor, que é a reunião de todas nós. Mas o amor necessita de dois. Enquanto o segundo não visitar este jardim, esta rosa permanece em botão, e nós seremos suas guardiãs. Mas você não deve deixar de regá-la com suas lágrimas, de adubá-la com seus sorrisos. E de vir nos visitar de tempos em tempos. Precisamos muito destes cuidados seus...”

- Quem SÃO as rosas rubras? perguntei entre assustada e impaciente.

“Quem guarda as amizades e o amor, e distribui os dons da alma?” foi a resposta.

- Ah, é o coração! respondi.

E acordei.

28.10.04




O Rio de Janeiro tem muitas caras. Geralmente as que aparecem na mídia são a da criminalidade e da sensualidade exacerbada. Mas o Rio também tem sua suavidade escondida, às vezes o meio do lixo.

Era assim com o Profeta Gentileza, cujo nome de batismo era José da Trino, mas que foi rebatizado na tristeza, na loucura e no fogo: o incêndio do circo norte-americano em Niterói, no dia 17 de dezembro de 1961, no qual foram calcinadas cerca de 400 pessoas. Dizem que entre estas pessoas estava a família de José. O que aconteceu neste incêncio transformou a vida deste homem, e poderia ter transformado de muitas formas. Mas a dor e a loucura, em vez de virar violência e amargor, virou... Gentileza.

Este homem, até sua morte em 1996, percorria as ruas do Centro do Rio e as barcas Rio-Niterói, dizendo palavras de gentileza e escrevendo mensagens nas pilastras dos muitos viadutos. Poucas palavras restaram, porque algum prefeito pouco gentil achou que pintar os viadutos de cinza-tristeza era melhor que preservar as palavras de José. Mas parece que o espírito do Profeta paira ainda sobre o Rio, e afeta ainda algumas pessoas.

Este recente carioca aquijá se confessou afetado. E resolveu aderir à pequena e silenciosa campanha que eu trouxe do blog da Carol, Eu acredito em você. Pois está lançada a campanha faz um tempo, pelo Profeta Gentileza, e as crianças (Carol tem 16 anos) e as borboletas - e agora um escritor! - já aderiram.

Tomara que espalhe.

27.10.04

Ouvidos atentos, braços abertos


Escrevi para um amigo, ele me deu as costas. Falei com uma amiga, ela me deu conselhos. A rejeição foi o chute no estômago no lutador caído. E de que adiantam conselhos quando se está assim? As palavras não entram, não conseguem atravessar a eterna discussão entre a mente e o coração: "Não pode!" "Mas eu quero!" "Não pode!" "Mas eu quero!!" A dor era a mesma, e também a confusão. Que fazer, que fazer, com quem falar? Paro, ando, escrevo, choro, peço colo a meu pai, me deixo atropelar por um caminhão?

Aí, duas coisas aconteceram. Escutei sua voz. Cansada, tensa, aborrecida. Mas era você. Eu não estava muda, e você não estava surdo. A certeza de que o dolorido passa consolou, ou ao menos mandou a enxaqueca embora. Conversamos, desenhamos, a sensação de estranheza, de que o mundo tinha acabado, foi sumindo durante a noite.

A segunda coisa foram os braços abertos do amigo. Acolheu (era só o que eu queria!) o que o outro amigo não quis nem ver. Escutou sem julgar, falou palavras de carinho, falou a principal: eu ENTENDO. Não eu TE entendo, mas eu entendo. Entendendo, ele me ajudou a desenrolar. Desenrolando o fio deste novelo emaranhado, descobri a Eternidade.

Amor não acaba, amor é eterno. Esta certeza que é seu chão há de ser meu teto.

24.10.04

História sem Título


"...so good on paper... so romantic... so bewildering..."

No quarto ela arrumou as malas. Malas leves, o que ela levava com ela de mais precioso não pesava muito. O gosto do primeiro beijo na estação do metrô; o som da primeira vez que ele gemera seu nome; a textura da pele dele na sua mão; o cheiro de homem limpo nas suas narinas. Além disso, algumas roupas, as fantasias que vestira para fazê-lo feliz.

"...I know nothing stays the same..."

Saía sem deixar muitas pistas, não sobrara muito de concreto, o principal estava no coração. Deixou no travesseiro alguns fios de cabelo. No chão, ao pé da cama, um chinelo virado. Na maçaneta, um sutiã. Na pia do banheiro, um montinho de pasta de dente. Na sala, alguns CDs fora da caixa, com uma risada... ela sabia que ele ficava maluco com desordem. Mas, quem sabe desta vez, ele sorriria também, entendendo que ela precisava deixar alguma marca que estivera ali, mesmo sabendo que eram marcas fáceis de apagar.

"...Down comes the rain, and washed the spider out..."

Na cozinha, um copo na bancada, com um dedo de água dentro. O avental esticado em cima da pia, para lembrar as tantas vezes que ele a abraçara por trás enquanto cozinhava. Uma colher de pau largada sobre o fogão. No ímã da geladeira, em forma de borboleta, um bilhete preso que diz apenas: "fui".

"... I believe in love, now who knows where or when, but it's coming around again..."

Parada no umbral da porta aberta, ela olhou longamente para dentro do que fora o seu refúgio nestes anos em que ela amara com o desprendimento que só os amores impossíveis têm. E descobriu, não muito surpresa, que a dor da amputação daquele amor não era menor por desejar sinceramente que ele fosse feliz sem ela.

"...itsy-bitsy spider climbs up the water sprout"

Antes de fechar a porta pela última vez, considerou a possibilidade de tirar aquela música do repeat e desligar o som. Ele sempre era tão preocupado com curto-circuitos. Considerou a possibilidade por apenas alguns segundos, depois deu de ombros. Ele chegaria logo com sua nova menina. Seria uma maneira de quebrar o gelo, explicar porque ele deixava Carly Simon tocando num apartamento vazio. Como a concordar com ela, Carly canta naquele momento...

"Don't mind if I fall apart, there's more room in a broken heart..."

Nada mais a fazer, a não ser seguir a marcação da peça: exit stage, left. Bateu a porta com um 'merda' baixinho, sabendo de antemão que aquele aperto na garganta ia levar litros de lágrimas para passar.

"It's coming around again..."

18.10.04



Um Certo Cansaço



A vida tem coisas espetaculares. As ditas coincidências que nos levam a dobrar uma esquina e dar de cara com uma alma gêmea, O gesto inesperado de apoio e carinho vindo de uma pessoa com quem não se contava. Um dia que nasce esplendoroso de dentro de uma noite chuvosa. A precisão quase geométrica das pétalas de uma rosa. Tem muita coisa que faz com que se olhe em volta e diga: Deus fez tudo muito bem feitinho...

Mas tem gente que parece ter como ocupação profissional transformar o bonito em feio, o milagre em corriqueiro, a vida em tédio. Alguns por falta de um olhar mais caridoso para si e para o mundo, alguns atormentados por tarefas prementes desta nossa época agitada, outros simplesmente porque sofrem de azedume crônico da alma. Entretanto, há pessoas demais assim, e as almas mais líricas sofrem com os constantes baldes de água fria a lhe jogarem no rosto.

Hoje, se fosse possível, gostaria que todos que lessem isto tentassem olhar longamente e em silêncio para algo bem bonito - pode ser esta rosa aí em cima - e deixassem que a mensagem que está oculta nesta beleza se revelasse diantede seus olhos.

"The most incredible things about miracles is that they happen. A few clouds in heaven do come together into the staring shape of one human eye. A tree does stand up in the landscape of a doubtful journey in the exact shape of a note of interrogation. I have seen both these things myself within the las few days. Nelson does die in the instant of victory; and a man named Williams does quite accidentally murder a man named Williamson; it sounds like a sort of infanticide. In short, there is in life a sort of elfin coincidence which people reckoning on the prosaic may perpetually miss. As it has been well expressed in the paradox of Poe, wisdom should reckon on the unforeseen." (G.K. Chesterton - Father Brown Stories - Penguin Popular Classics - p. 07)

"A coisa mais incrível a respeito dos milagres é que eles acontecem. Algumas nuvens no céu se juntam, sim, na forma de um olho humano a encarar. Uma árvore se destaca, sim, da paisagem de uma jornada dúbia, na forma exata de um ponto de interrogação. Eu mesmo vi estas duas coisas nos últimos dias. Nelson realmente morre no instante da vitória; e um homem chamado Williams, por puro acidente, pode, sim, assassinar um homem chamado Williamson ("Filho de William"); soa como uma espécie de infanticídio. Em suma, existe na vida uma espécie de coincidência mágica que as pessoas que raciocinam com o prosaico perpetuamente ignoram. Como já foi bem expresso no paradoxo de Poe, a sabedoria tem de levar em conta o imprevisto." (tradução minha)

11.10.04


Mais um Adeus



Recife, inverno de 1985. A mocinha que eu fui ficou sabendo que um dos escritores que adorava estaria numa livraria o Shopping Recife autografando seus livros. Entusiasmada mas tímida, pegou dois deles e levou dentro da bolsa. Não sabia se teria coragem de se aproximar de tão exaltada figura e pedir o carinho de ter uma dedicatória pessoal para provar que ele era de fato seu amigo querido. Não estranhem ela nunca o ter visto antes, o amor através dos livros que os escritores e seus leitores trocam é forte e verdadeiro. Tanto quanto o leitor precisa da visão especial do escritor para conhecer melhor o mundo, o escritor precisa daqueles corações e daquelas mentes vibrando em harmonia com ele e dizendo, "Sim, é isso mesmo! Como não percebi antes?"

A Sue-mocinha então selecionou os dois livros deste amigo, e foi para o shopping, ainda sem saber se teria coragem de se aproximar dele. Vai que a imensa simpatia e doçura presente nos livros se mostrasse apenas construção do talento dele de escritor, e o homem não fosse da mesma estatura?

O Shopping. Lá estava ele. De longe percebeu um homem maduro, mais velho um pouco que seu pai, mas ainda bonitão. Parecia simpático. Foi-se aproximando devagarinho, e teve a grata surpresa de ser acolhida com um enorme sorriso. O grande escritor não se esquivou de mineiramente trocar um dedinho de prosa com a menina, e ainda escreveu uma dedicatória que fez o coração dela inchar de alegria: "A Sue esta lembrança afetuosa com um abraço amigo do Fernando Sabino - Recife, 19/06/85"

O livro, Faca de Dois Gumes, foi relido aquela noite com uma nova emoção. Agora ela sabia um pouquinho mais deste livro, sabia que ele tinha sido escrito por um homem bom, com entusiasmo de menino e modos de cavalheiro. Ela já tinha vontade de escrever bem como ele. Agora passou a ter vontade de ser uma pessoa assim.

Quase 20 anos depois, o telejornal anuncia que o meu amigo morreu aos 81 anos, depois de dois anos de luta contra um câncer. Será que alguém vai entender as lágrimas que me escorrem dos olhos enquanto escrevo isto? Será que vocês vão entender que Fernando Sabino - e Manoel Bandeira, e Carlos Drummond e Clarice Lispector e tantos outros - é parte da minha alma?

Hoje o mineirinho contador de causo morreu. Esse mundo ficou um pouquinho mais vazio e mais triste. E o outro mundo ficou um pouquinho mais alegre. Diz o noticiário...



Velório de Sabino é no S. João Batista
O Globo
GloboNews TV

RIO - O corpo do escritor Fernando Sabino está sendo velado no cemitério São João Batista, em Botafogo, Zona Sul, onde será enterrado nesta terça-feira, às 11h. Alguns amigos como o cartunista e escritor Ziraldo e o jornalista Wilson Figueiredo estão no local. Sabino sofria de um câncer no fígado há dois anos e, segundo amigos, passou os últimos dois dias sedado. A pedido do escritor, seu túmulo terá a inscrição "nasci homem, morri menino".




O que eu digo é que este menino tocou fundo meu coração, e agora o Asa está de luto. Não quero falar mais, deixo com vocês Fernando Sabino...





A Última Crônica - Fernando Sabino



A caminho de casa, entro num botequim da Gávea para tomar um café junto ao balcão. Na realidade estou adiando o momento de escrever.


A perspectiva me assusta. Gostaria de estar inspirado, de coroar com êxito mais um ano nesta busca do pitoresco ou do irrisório no cotidiano de cada um. Eu pretendia apenas recolher da vida diária algo de seu disperso conteúdo humano, fruto da convivência, que a faz mais digna de ser vivida. Visava ao circunstancial, ao episódico. Nesta perseguição do acidental, quer num flagrante de esquina, quer nas palavras de uma criança ou num acidente doméstico, torno-me simples espectador e perco a noção do essencial. Sem mais nada para contar, curvo a cabeça e tomo meu café, enquanto o verso do poeta se repete na lembrança: "assim eu quereria o meu último poema". Não sou poeta e estou sem assunto. Lanço então um último olhar fora de mim, onde vivem os assuntos que merecem uma crônica.

Ao fundo do botequim um casal de pretos acaba de sentar-se, numa das últimas mesas de mármore ao longo da parede de espelhos. A compostura da humildade, na contenção de gestos e palavras, deixa-se acrescentar pela presença de uma negrinha de seus três anos, laço na cabeça, toda arrumadinha no vestido pobre, que se instalou também à mesa: mal ousa balançar as perninhas curtas ou correr os olhos grandes de curiosidade ao redor. Três seres esquivos que compõem em torno à mesa a instituição tradicional da família, célula da sociedade. Vejo, porém, que se preparam para algo mais que matar a fome.

Passo a observá-los. O pai, depois de contar o dinheiro que discretamente retirou do bolso, aborda o garçom, inclinando-se para trás na cadeira, e aponta no balcão um pedaço de bolo sob a redoma. A mãe limita-se a ficar olhando imóvel, vagamente ansiosa, como se aguardasse a aprovação do garçom. Este ouve, concentrado, o pedido do homem e depois se afasta para atendê-lo. A mulher suspira, olhando para os lados, a reassegurar-se da naturalidade de sua presença ali. A meu lado o garçom encaminha a ordem do freguês. O homem atrás do balcão apanha a porção do bolo com a mão, larga-o no pratinho -- um bolo simples, amarelo-escuro, apenas uma pequena fatia triangular.

A negrinha, contida na sua expectativa, olha a garrafa de Coca-Cola e o pratinho que o garçom deixou à sua frente. Por que não começa a comer? Vejo que os três, pai, mãe e filha, obedecem em torno à mesa um discreto ritual. A mãe remexe na bolsa de plástico preto e brilhante, retira qualquer coisa. O pai se mune de uma caixa de fósforos, e espera. A filha aguarda também, atenta como um animalzinho. Ninguém mais os observa além de mim.

São três velinhas brancas, minúsculas, que a mãe espeta caprichosamente na fatia do bolo. E enquanto ela serve a Coca-Cola, o pai risca o fósforo e acende as velas. Como a um gesto ensaiado, a menininha repousa o queixo no mármore e sopra com força, apagando as chamas. Imediatamente põe-se a bater palmas, muito compenetrada, cantando num balbucio, a que os pais se juntam, discretos: "parabéns pra você, parabéns pra você..." Depois a mãe recolhe as velas, torna a guardá-las na bolsa.

A negrinha agarra finalmente o bolo com as duas mãos sôfregas e põe-se a comê-lo. A mulher está olhando para ela com ternura - ajeita-lhe a fitinha no cabelo crespo, limpa o farelo de bolo que lhe cai ao colo. O pai corre os olhos pelo botequim, satisfeito, como a se convencer intimamente do sucesso da celebração. Dá comigo de súbito, a observá-lo, nossos olhos se encontram, ele se perturba, constrangido - vacila, ameaça abaixar a cabeça, mas acaba sustentando o olhar e enfim se abre num sorriso.

Assim eu quereria minha última crônica: que fosse pura como esse sorriso.

Texto extraído do livro "A Companheira de Viagem", Editora do Autor - Rio de Janeiro, 1965, pág. 174.

30.9.04



Caixas



Pessoas sensíveis demais às vezes procuram proteção fechando suas almas numa caixa muito bem trancada, à qual ninguém mais tem acesso. Pode ser uma caixa rica ou pobre, forrada de jornal ou de almofadas aveludadas. Pode ser feita do mais perfumado sândalo entalhado ou do mais duro aço. Não importa, a realidade é que quem está lá dentro sofre da mais profunda solidão.

Foi de dentro de uma caixa destas, feita de resistente jacarandá e forrada de livros, que eu vi chegar o início da minha adolescência. Eu fui uma pré-adolescente trancada dentro de mim mesma, e eu não sabia sair. Mas Deus nunca me desampara, e Ele mandou um emissário com a chave que eu tinha perdido.

Um anjo, Stella era um anjo caído. É engraçado como este nome - Estrela - volta e meia surge importante na minha vida, geralmente quando estou chegando em alguma encruzilhada do meu caminho. Pois, "Tia Stella" era uma amiga de minha mãe formada em educação física que reunia pequenos grupos de amigas para aulas de ginástica.

Minha mãe, sempre preocupada com minha tendência para engordar - o que para ela era a pior herança genética que havia me legado - , e diante da minha recusa categórica de ir para uma academia, convenceu-me a participar de algumas aulas da Tia Stella.

Ela era uma mulher doce e tranquila por fora, que lutava contra seus demônios interiores. Tinha sua própria caixa, só que forrada de espinhos. Mesmo assim, teve compaixão daquela menina emudecida. Com uma mistura de carinho, paciência, exercícios físicos, palavras de incentivo, conselhos e aulas de expressão corporal, devagarinho abriu a tampa da minha caixa, estendeu a mão e me ajudou a sair.

Não consigo lembrar de maior gesto de amor que alguém além de minha mãe tenha tido comigo. Se hoje eu escrevo, e algumas pessoas agradecem dizendo que minhas palavras as ajudam, eu tenho de responder que os agradecimentos se devem em grande parte à Stella. Fazem mais de 25 anos que não a vejo, e soube que ela perdeu algumas grandes batalhas contra aqueles demônios, mas venceu algumas também. Espero que tenha conseguido trocar o forro de espinhos de sua caixa por um suave cetim. Eu rezo por isto, porque - se minha mãe me trouxe a este mundo e me fez a pessoa que sou - a Stella me apresentou à vida e me deu as primeiras ferramentas para conquistar minha autonomia. E eu a amo muito, e sou muito agradecida, e serei para sempre.

A minha caixa continua aqui, a tampa aberta, muitos pequenos tesouros conquistados ao longo destes 40 anos carinhosamente arrumados dentro dela. Ainda me refugio lá dentro em momentos de muita dor. Só que hoje a chave está segura bem firme na minha mão.

Então, deixo aqui o convite para aqueles que amo e sei que têm suas caixas, alguns deles mal tendo começado as tentativas de sair delas: venham, queridos venham para fora, vale a pena. O mundo é terrivelmente belo e assustador, cheio de aventura e de frieza, de alegria mesclada com perda. Mas há muito tempo eu aprendi que não há coisa alguma tão assustadora que não possa ser enfrentada, se há uma mão estendida esperando pela nossa.


Minha mão está aqui.



Hide In Your Shell

Supertramp

Hide in your shell cos the world is out to bleed you for a ride
What will you gain making your life a little longer?
Heaven or Hell, was the journey cold that gave your eyes of steel?
Shelter behind painting your mind and playing joker

Too Frightening to listen to a stranger
Too Beautiful to put your pride in danger
You're waiting for someone to understand you
But you've got demons in your closet
And you're screaming out to stop it
Saying life's begun to cheat you
Friends are out to beat you
Grab on to what you scramble for

Don't let the tears linger on inside now
Cos it's sure time you gained control
If I can help you, if I can help you
If I can help you, just let me know
Well, let me show you the nearest signpost
To get your heart back on the road
If I can help you, if I can help you
If I can help you, just let me know.

All through the night as you lie awake and hold yourself so tight
What do you need, a second-hand-movie-star to tend you?
I as a boy, I believed the saying the cure for pain was love
How would it be if you could see the world through my eyes?

Too Frightening - the fire's getting colder
Too Beautiful- to think you're getting older
You're looking for someone to give an answer.
But what you see is just an illusion
You're surrounded by confusion
Saying life's begun to cheat you
Friends are out to beat you
Grab on to what you can scramble for

Don't let the tears... just let me know
I wanna know... I wanna know you...
Well let me know you
I wanna feel you
I wanna touch you
Please let me near you
Can you hear what I'm saying?
Well I'm hoping, I'm dreamin', I'm prayin'
I know what you're thinkin'
See what you're seein'
Never ever let yourself go

Hold yourself down, hold yourself down
Why d'ya hold yourself down?
Why don't you listen, you can
Trust me,
There's a place I know the way to
A place there is need to feel you
Feel that you're alone
Hear me
I know exactly what you're feelin'
Cos all your troubles are within you
Please begin to see that I'm just bleeding to
Love me, love you
Loving is the way to
Help me, help you -
Why must we be so cool, oh so cool?
Oh, we're such damn fools...

19.9.04


Oh, boy!




Bom, muita gente melhor que eu já falou bastante do livro, inclusive o próprio autor. Mas é necessário que eu faça algum tipo de homenagem a este talentoso amigo.

Fabio, lá vai: um conto de presente

FDR chega ao Paraíso

Finalmente, depois de uma longa vida de sucessos e de negar com veemência, durante toda ela, a existência de qualquer coisa remotamente parecida com Deus, Fabio Danesi morre. Ainda meio desorientado e sem consciência completa de sua situação, por estar dormindo ao falecer, Danesi chega aos Portais do Paraíso. Na entrada, um coro de anjos, São Pedro e Fred Astaire o aguardam.

- Benvindo, Filho! São Pedro sorri, bondosamente.
- Welcome, my boy! Fred Astaire sorri, alegre.
- Aleluia! Cantam os anjos.

Fabio observa aquilo por um instante. Coçando a cabeça, diz para si mesmo:

- Eu bem que pensei que não devia ter tomado tanto vinho hoje à noite, que sonho esquisito!

- Não, não, não é sonho my dear chap. Você morreu e está no Paraíso. Vamos entrar, Deus decretou feriado e tem uma festa à sua espera. Fred Astaire estende a mão num cumprimento.

- Deus? Estou ficando gagá, só pode ser. Deus não existe. Nossa, o que tinha naquele vinho!? Responde Danesi, apertando a mão do dançarino, mesmo achando tudo aquilo alucinação, pois ele é um cavalheiro.

- Ah, sim. Sobre este probleminha, senhor Rossi - retruca São Pedro. O Senhor Todo Poderoso não só existe, como é um grande fã seu. Ele o está aguardando, quer discutir alguns pontos de sua obra.

Fabio apenas levanta as sobrancelhas, incrédulo.

- Discutir MINHA obra com Deus? E que tal se eu quiser discutir com Deus a obra DELE? partindo, é claro, do princípio que o tal Ele exista.

- Bem, old fellow, este é um assunto meio espinhoso. Deus é um artista, ele não tem muita simpatia por críticos. Qual o autor que tem, não é verdade?

- Nenhum que eu conheça, Mr. Astaire. Nem mesmo eu, para falar a verdade.

- Fred, m'boy, e eu espero que me permita chamá-lo Fabio? Oh, claro, meu caro. O Senhor não que r criticar sua obra, apenas conversar sobre ela.

- Ora, porque não? Tudo neste sonho está tão estranho, não me espanta ter Fred Astaire me chamando de Fabio e Deus querendo conversar sobre minha obra. O escritor sorri seu sorriso doce de menino, que faz com que os anjos soltem arpejos de felicidade

- Caro Fabio, encare se quiser como um sonho. Depois de algumas semanas aqui, você vai começar a se acostumar com a idéia. Agora, shall we? As celebrações estão esperando apenas por você para começar. Astaire sorri de volta e indica os Portais do Paraíso, abertos e iluminados por uma luz intensa.

- Hummm... férias no paraíso, eh? Isso dava um conto interessante. Fred, por acaso tem com você papel e caneta?

São Pedro sorri, benevolente.
Fred Astaire sorri, divertido.
Aleluia! Cantam os anjos.

10.9.04


Ruins


Reforma



Primeiro vem o quebra-quebra. Devagarinho as paredes vão-se abrindo em janelas e da escuridão faz-se a luz. Mas a luz nos mostra que há centenas de pequenos defeitos a ser corrigidos, milhares de mínimas falhas para consertar. Pega o formão, respira fundo, bate-bate, fura-fura, derruba, joga fora o entulho.

Depois do sofrimento começa a construção. Às vezes a construção é lenta, parece que nunca vai acabar. Faz a argamassa, espalha em cada tijolo, monta o complexo quebra-cabeça, deixa secar. Enche os buracos, alisa a massa, faz a parede crescer. Dá forma ao conteúdo novo, faz um novo espaço nascer.

De repente, surpresos, nos pegamos colorindo uma vida que estava cinza, ordem e beleza brotando do caos, olhamos em volta perplexos e nos perguntamos: "Mas fui EU que fiz tudo isto?"

Para Maurício, com um beijo.

8.9.04



O que é que se diz?


Ah, é duro quando uma pessoa que amamos parte antes de nós, quando parte cedo demais. Não há muitas palavras que consolem, pois neste caso só mesmo o tempo cura a ferida. Mas, para ti, poeta, quis deixar como um acalanto as palavras de outro poeta, que conviveu por muito tempo de perto com a indesejada das gentes.

Para Rogério Simões, Manuel Bandeira. Com um beijo meu.


OVALLE

Estavas bem mudado
Como se tivesses posto aquelas barbas brancas
Para entrar com maior decôro a Eternidade.
Nada de nós te interesava agora
Calavas sereno e grave
Como no fundo foste sempre
Sob as fantasias verbais enormes
Que faziam teus amigos rir e
Punham bondade no coração dos maus.

O padre orava:
- "O côro dos anjos te receba..."
Pensei comigo:
Cantando Estrela brilhante
Lá do alto mar!...

Levamos-te cansado ao teu último endereço
Vi com prazer
Que um dia afinal seremos vizinhos
Conversaremos longamente
De sepultura a sepultura
No silêncio das madrugadas
Quando o orvalho pingar sem ruído
E o luar for uma coisa só.



(Ah, Alex, para ti, amigo querido, saudades da sua butterfly...)

4.9.04




Fim de sonho, Início de Realização



Foram quatro dias da mais profunda felicidade. Acabou dia 02 de setembro de 2004 um projeto que veio do fundo do meu coração, fruto de muito trabalho duro, resultado dos esforços conjuntos de membros de um grupo que se organizou em torno de uma paixão comum, e que depois deste simpósio posso com firmeza chamar de grandes amigos. Foi mais do que bom. Foi um sonho. Um sonho que se tornou realidade na minha frente. Mais importante, percebi que não era um sonho só nosso, destas pessoas do Brathair.

Foi gratificante ver a seriedade de todos, desde o aluno mais novinho da graduação até o professor doutor mais graduado. Foi emocionante sentir a felicidade de todos, dezenas de alunos vieram me abraçar no último dia e dizer o quanto estavam tristes de ter acabado. Eu também estou triste que acabou. Eu nunca senti tanta irmandade numa atividade acadêmica antes. Todas as palestras lotadas, pessoas tomando nota, gravando, fazendo perguntas. Nunca vi tantos olhos brilhando juntos.

Nunca vi monitoras fazerem 'claque' para uma professora de outra universidade que elas tinham acabado de conhecer, com direito a cartaz escrito "Sue, você é gente paca!" (Risos) Alguém aí já viu garotas escreverem isto de uma professora que estava fazendo elas trabalharem feito doidas? Que meninas especiais, estas monitoras... Uma delas chegou a dizer que vai se formar na UFRJ e depois se matricular no curso de secretariado executivo da minha universidade, só para ser minha aluna de inglês... menina danada, só para me fazer chorar...

Agora, é fortalecer e construir sobre o sonho e a felicidade de todos, estabelecer uma base de estudos medievais forte neste país, descobrir de onde vimos e para onde podemos ir. Com a alma cantando, as verdes colinas de Erin combinadas com as verdes matas da Terra de Santa Cruz. Eu já falei demais, como sempre, mas agora passo a palavra a Amergin, irmão de Evir, os primeiros príncipes Milesianos a colonizar a Irlanda, muitos séculos antes de Cristo. Estes foram os primeiros versos feitos na Irlanda, esta terra de guerreiros e poetas... vieram do livro Leabhar Gabhála, ou Livro das invasões.




The Mystery (translated by Douglas Hyde)

I am the wind which breathes upon the sea,
I am the wave of the ocean,
I am the murmur of the billows,
I am the ox of the seven combats,
I am the vulture upon the rocks,
I am a beam of the sun,
I am the fairest of plants,
I am a wild boar in valour
I am a salmon in the water,
I am a lake in the plain,
I am a word of science,
I am the point of the lance in battle,
I am the god who created in the head the fire.
Who is it who throws light into the meeting on the mountain?
Who announces the ages of the moons?
Who teaches the place where couches the sun?
(If not I)

O Mistério (tradução para o português por Assunção Medeiros)

Eu sou o vento que sopra aragem sobre o mar,
Eu sou a onda do oceano,
Eu sou o murmúrio das vagas,
Eu sou o touro dos sete combates,
Eu sou o corvo sobre as pedras,
Eu sou um raio de sol,
Eu sou a mais bela das plantas,
Eu sou um javali selvagem em valor,
Eu sou o salmão na água,
Eu sou um lago na planície,
Eu sou uma palavra de ciência,
Eu sou a ponta da lança em batalha,
Eu sou o deus que criou na cabeça de fogo.
Quem é aquele que joga luz no encontro nas montanhas?
Quem anuncia as eras das luas?
Quem ensina o lugar de descanso do sol?
(A não ser eu)

31.8.04

Update no I SNECG

Meninos e meninas, a abertura deste Simpósio foi um dos momentos mais alegres do qual já fiz parte, foi muito emocionante ver aquela quantidade de gente querendo escutar a mim e a meus colegas, querendo discutir a escrita e a história do medievo, querendo se conhecer, conversar.

Todos cobertos de boa vontade um com o outro, os representantes consulares presentes todos fizeram alegres e elogiosos discursos, as primeiras palestras interessantíssimas, tudo funcionando como deveria, os pequenos problemas que surgiram causado pelo inusitado aumentodo interesse pelo evento.

E, no final da abertura, Paola nos deliciando com sua gaita galesa, o som grave/agudo do fole tomando conta do silêncio profundo da sala.

Foi PERFEITO.

30.8.04

Presentes especiais


Existem alguns presentes que a gente não esquece nunca na vida. Meu primeiro presente assim foi uma passagem de avião.

Antes que alguém estranhe, uma explicação. Já falei aqui, em vários posts, que perdi minha mãe para o câncer aos 21 anos de idade, depois de cinco anos de muita luta. O que não lembro se já mencionei aqui é que ela passou seus últimos dois anos de vida em Recife, e eu longe dela aqui no Rio. Quando ela entrou no que os médicos chamam de 'estado terminal' - quando sua alma começou a se preparar para abandonar seu corpo cansado - ela ficava uma semana de cada mês comigo aqui em casa, para as sessões de quimioterapia. Foi o período em que ficamos mais juntas, eu dormia no quarto com ela, conversávamos feito duas amigas adolescentes, até dormir.

Mas a última semana de vida ela passou no hospital em Recife onde finalmente descansou. Logo que baixou hospital, meu pai ligou para o Rio e avisou a mim e a meu irmão que ela estava com pneumonia. Para alguém no estado em que ela estava, isto era a última chamada do vôo, e eu sabia. Implorei para meu pai que me mandasse buscar. Eu PRECISAVA estar com ela. Meu pai, provavelmente querendo me poupar, pediu que eu aguardasse notícias. Meu irmão assistia a tudo calado. Quando me viu desligar o telefone e soluçar, ele perguntou se papai ia mandar a passagem. Disse que não e comecei a ligar para os parentes próximos. Ele saiu sem falar mais nada.

Dois ou três telefonemas depois, volta ele. Com aquela passagem de que falei no início deste texto, comprada com seu salário. Meio envergonhado, pois meu irmão é muito reservado, ele me põe a passagem na mão e diz: "vai, Sue, eu não tenho coragem, mas eu sei o quanto é importante para você." Importante? Dezoito anos depois, ainda tenho guardado num lugar bem protegido o canhoto do bilhete. Foi a coisa mais bonita que meu irmão podia ter feito, por mim e por ela.

Muitos anos passaram, e eu tive de substituir de muitas formas em casa a mãe que partira, e isto foi um impedimento concreto de seguir muitos sonhos. Não é uma reclamação, pois se a opção fosse novamente colocada à minha frente, novamente faria tudo o que fiz. Mas é uma constatação realista. Uma das coisas que ficou guardada na gaveta era meu gosto e alegria em escrever. Fiquei muda, por 15 anos. Até que recebi meu segundo presente inesquecível. E este, a pessoa que deu sequer sabe que me deu um presente mais precioso que todas as barras de ouro do mundo. Ele me deu minha voz de volta, com um gesto simples, mas eloquente, de enviar meu primeiro texto para publicação virtual. Um escritor por quem eu tinha o maior respeito e admiração considerou um texto meu bom o suficiente para ser publicado, me tirou de um casulo de anos e me deu incentivo para abrir estas Asas de Borboleta. Alexandre, você nem sabe, mas você me devolveu minha vida, que estava perdida de mim. Este é o segundo presente que jamais vou esquecer. Obrigada.

O terceiro presente inesquecível foi um xale. Um agradecimento pela amizade, pela lealdade, pela empatia. Um dos gestos mais bonitos que me fizeram, mas não quero falar dele, me dá vontade de chorar.

Quando eu já considerava que tinha esgotado minha quota de presentes inesquecíveis, quando eu estava fundo num buraco de tristeza, pensando até mesmo em calar novamente minha voz, que não é alta nem é bela como a de outros escritores, mas é fonte direta de força, de felicidade para mim, num mundo onde é raro encontrar fontes destas duas coisas, outro milagre aconteceu. Uma cadeia de pequenos acontecimentos me levou delicadamente pela mão até um blog que pertence a uma pessoa que entende das pequenas coisas que eu entendo: lealdade familiar; caminho diário de trabalho e de luta; vitória conquistada devagarinho, centímetro a centímetro, no meio de muito sofrimento; um coração cheio de amor e de dor. Um poeta.

Eis que um outro horizonte se abre onde não parecia haver mais nada, e o novo me devolve o antigo, e agora minha vontade é escrever, e produzir, e deixar estar. Levar esta voz até onde ela conseguir alcançar, para me sentir viva outra vez. Rogério, apesar de seu lindo presente estar escrito em meu coração, eu achei que ele se perderia na janela de comentários, e deveria estar aqui. Obrigada, poeta, pela ajuda que você nem sabe que deu. É sempre assim.

ASA DE BORBOLETA

Queria dedicar-te um canto
Nesta terna e longa viagem
Através da poesia.
Queria dar-te uma flor
Que jamais seque algum dia.
Pois ser feliz é esquecer…
A amargura do momento
E só assim a vida é sublime
Bonita ao mesmo tempo
Como este mar
Que nos separa
Nesta noite amena e calma
Silêncio! Que o meu luar
Vai beijar a tua alma.

Rogério Simões

26.8.04

PLÁGIO


Dona Glória, perigosa não é a lucidez, é a cartinha que a senhora vai receber de alguns advogados, se não corrigir imediatamente o que fez. Apague o texto ou o publique na íntegra, com créditos e link para cá.

Amigos, tem gente achando que os textos do Asa podem ser copiados e publicados - com cortes mutilantes - em seus próprios blogs. Tem gente querendo voar com minhas asas, veja só... e não é nenhuma adolescente, que poderia ter feito isto com uma certa dose de inocência, e sim uma senhora que regula de idade comigo, e deveria saber se comportar melhor.

Nossa, parece que este agosto é mesmo o mês da canalhice. Ainda bem que está acabando.

Ah, apesar de Dona Gloria não fazer a gentileza, eu faço. Quem quiser comprovar o plágio do post CONVITE, de 18 de fevereiro de 2004, vá ao blog http://pereira.gloria.blog.uol.com.br/

ADENDO AO POST: Dona Gloria já me escreveu, pedindo desculpas e retirando o post.

"Sue, Reconheço o erro...li teu texto e ele se encaixava tanto com o que eu queria que uma pessoa lesse, pq traduz bem um momento que passo. Eu anotei teu endereço ia hj te mandar um post avisando que copiei e pedindo pra linkar, errei me descupe..."

Sim, Dona Glória, está desculpada. Mas tome mais cuidado com os textos dos outros... pode usar, se linkar e não adulterar.Ela foi até boazinha, vocês não acham?



On the eve of meeting a bunch of Irish-loving folks, here's an Irish blessing...



May those who love us love us.
And those that don't love us,
May God turn their hearts.
And if He doesn't turn their hearts,
May he turn their ankles,
So we'll know them by their limping.


17.8.04

Tem gente que transforma sua dor em fel. Eu procuro transformar minha dor em doçura. Mas o Rogério, ahh... Rogério transforma sua dor em beleza pura.




Poemas de amor e dor

MEIO HOMEM INTEIRO


Meia selha

De lágrimas.

Meio copo

De água

Meia tigela

De sal

Meio homem

De mágoa.

Meio coração

Destroçado

Meia dor

A sofrer.

Meio ser

Enganado

Num homem

Inteiro a morrer.

Rogério 1974

14.8.04

A amizade que se oferece



"... o pensamento simples, a intenção inocente, a sua transformação natural em coisa muito grande, a capacidade de sustentar brava e alegremente esta coisa muito grande, a ausência da perda (ou a sua transformação em algo fértil e ainda maior e mais belo) e a perenidade." (Alfredo Votta)

Esta frase foi um soco no estômago. Visitava eu o blog de meu soberano e amigo Imperador da Svolonésia, e de seu texto suave vem um gancho que me agarra o coração e torce com força. Porque Alfredo, das profundezas de sua sensibilidade, consegue muitas vezes dizer o que todos nós sentimos com a exatidão do explorador viajado, que mapeou cada pedaço do caminho. There and back.

Falava ele de uma sonata de Schubert, mas falo eu de algo que acontece de vez em quando comigo. Esta frase descreve EXATAMENTE o tipo de amizade que ofereço, e o fato de eu oferecer coisa tão grande confunde e assusta as pessoas de intenções menores. Já fui chamada de carente, já fui chamada de sufocante, já fugiram de mim, já me rechaçaram com violência. Eu já me recolhi, ferida e perplexa, sem entender o motivo de tanta ruína onde só fora oferecido o bem. Já cheguei a questionar a estrutura mesma da minha personalidade, debruçando sem pena sobre ela e investigando-a com o cuidado de médico legista de seriado americano.

Mas a questão é esta: não posso, não quero e não devo aleijar minha alma, cortando-lhe as pernas e os braços, para entrar em espaços onde ela não cabe. Eu posso, sim, e ofereço, a todos por quem tenho afeto, a força de minha lealdade, a maciez e o calor do meu abraço, o ouvido atento e o coração aberto. Ofereço mesmo os espaços abertos para o vôo, e sugiro que tentemos ver que chega mais alto. Ofereço o riso e o choro sinceros, a gargalhada solta.

Mas eu não vou, nem mesmo por quem amo muito - e eu amo MUITO - transformar uma sonata de Schubert num samba de uma nota só.

13.8.04



Queridos todos,


Eu tenho estado, e vou estar, absolutamente absorvida neste projeto do grupo de estudos ao qual pertenço,o Brathair

Estou trabalhando, junto com meu caro amigo Prof. Dr. Álvaro Alfredo Bragança Junior, na coordenação geral deste simpósio, e está parecendo que vai ser um evento muito bacana.

No entanto,tudo na vida tem um preço a se pagar, e o meu neste caso é a absoluta falta de tempo e energia para produzir textos que não estejam relacionados ao simpósio. Sempre que eu puder vir aqui e dar um beijinho em cada um, prometo que venho. Mas, se eu sumir, não estranhem muito.

Estão, é claro, todos convidados a comparecer à Faculdade de Letras da Universidade Federal do Rio de Janeiro, nos dias 30 e 31 de agosto e 01 e 02 de setembro, onde me encontrarão descabelada, esbaforida e muito feliz.

Eis o programa do evento...



SEGUNDA-FEIRA, 30 DE AGOSTO DE 2004

08:00h - Recepção de Material e Inscrições Novas

09:00h - Sessão de Abertura do Simpósio presidida pela Prof. Dra. Edione de Azevedo Trindade, Diretora da Faculdade de Letras da UFRJ e Representantes Consulares da Alemanha, Irlanda, Islândia, Noruega e Suécia

09:45h - Conferência Plenária I - Entre Druidas e Monges da Irlanda Prof. Dr. João Lupi (UFSC)

10:30 às 10:45 h - Intervalo

10:45 às 12:00 h - Mesa Redonda I - História e Literatura: cruzamentos interdisciplinares - Coordenador Prof. Dr. Ricardo da Costa (UFES) Prof. Dr. Ricardo da Costa (UFES)- O conhecimento histórico e a compreensão do passado: o historiador e a arqueologia das palavras
Profa. Dra. Andréia Cristina Lopes Frazão da Silva (UFRJ)– Reflexões sobre o diálogo entre a Literatura e a História no estudo dos textos medievais

12:15 às 13:15h - Sessão de Comunicações Celtas I - Celtas e Cristianismo - Coordenadora: Grad.Tatiana Bina (USP/MAE)
O Casamento Divino - Grad. Tatiana Bina (USP/MAE)
São Columbanus: o propagador do monasticismo celta - Grad. Tatiana Machado Boulhosa (USP)
São Patrício e a evangelização da Irlanda: uma análise da Confessio. Habilidade missionária ou milagres? - Grad. Dominique Vieira Coelho dos Santos (UFG)

12:15 às 13:15h - Sessão de Comunicações Germânicas I - Os Germanos da Antigüidade a Carlos Magno - Coordenadora: Profa. Dra. Arlete José Mota (UFRJ)
Um Estudo sobre a Germania de Tácito - Profa. Dra. Arlete José Mota (UFRJ)
Solidariedade e Desacordo na Política Germânica da Europa Pós-carolíngia - Prof. Dr. José Ernesto Pimentel Filho (UFPB)
Carlos Magno, o Pai da Europa – a formação do Sacro Império Romano Germânico - Grad.Thiago das Chagas Santos (UNESP/Araraquara)

TERÇA-FEIRA, 31 DE AGOSTO DE 2004

08:00 às 09:00 h: Mini-Cursos
Mini-Curso 01 - Arqueologia Viking - Prof. Dr. Johnni Langer (FACIPAL)
Mini-Curso 02 - Do país das fadas ao país das letras: as narrativas celtas - Prof. Me. Adriana Zierer (UEMA) & Profa. Me. Luciana Campos (UNESP)
Mini-Curso 03 - As noções de Império e imperador no Sacro Império Romano Germânico - Prof. Dr. Moisés Romanazzi Tôrres (UFSJ)

09:00 - 09:15h: Intervalo

09:15 - 10:15h Conferência Plenária II - Contatos Culturais na Bretanha Romana - Prof. Dr. Pedro Paulo A. Funari (UNICAMP)

10:15 - 10:30h - Intervalo

10:30 - 12:00h: Mesa Redonda II - Aspectos Mágico-religiosos da Cultura Celta - Coordenador Prof. Dr. João Lupi (UFSC)
Prof. Dr. João Lupi (UFSC) - As Monjas Irlandesas
Profa. Me. Luciana de Campos (UNESP/ SJ Rio Preto)A Herança de Dana: Aspectos da magia feminina celta
Grad. Vitor S. Lares (UFF) - A Imortalidade da Alma: o outro mundo céltico, mito e rito funerário

10:30 -12:00h: Mesa Redonda III - História e Literatura como leituras do Sacro Império nos séculos XII a XIV - Coordenador Prof. Dr. Moisés Romanazzi Tôrres (UFSJ)
Prof. Dr. Francisco José Silva Gomes (UFRJ) Os conflitos dos poderes universais: o Papado e o Império (Século XIII)
Prof. Dr. Moisés Romanazzi Tôrres (UFSJ) O providencialismo do Império Universal segundo Marsílio de Pádua
Prof. Dr. Álvaro Alfredo Bragança Júnior (UFRJ) A Poesia Sentenciosa de Walther von der Vogelweide como proposta de retrato social: ficção ou realidade?

12:00 -12:15h - Intervalo

12:15 -13:15h: Sessão de Comunicações Celtas II - Cultura celta - entre a oralidade e a Literariedade - Coordenador: Prof. Me. Filippo L. Olivieri (UFF)
Prof. Me. Filippo L. Olivieri (UFF) Os Druidas e a Transmissão Oral entre os Celtas
Cláudio Quintino (escritor e representante da Druid Network) Mitos-Sociedade-Paisagem: um trinômio para a real compreensão da Cultura Celta
Grad. Victor André Ribeiro (FAFI) Cultura Folclórica vs. Cultura Clerical no Ocidente Medieval: as narrativas de origem celta e suas representações culturais

12:15 - 13:15h: Sessão de Comunicações Germânicas II – Germanos e Sacro Império: fontes histórico-literárias - Coordenador Prof. Me. Vinicius Cesar Dreger de Araujo (UnG)
Prof. Dr. Vinicius Cesar Dreger de Araújo (UnG) Existiu um projeto imperial de História? Otto de Freising e a Chancelaria de Frederico I Barbarossa

Pós-Grad. Marlon Ângelo Maltauro (FAFI) O Simbolismo da Floresta na Völsunga Saga


12:15 - 13:15h: Sessão de Comunicações Germânicas III - Aspectos da cultura germânica nos Contos de Fada, na Música e na Literatura - Coordenadora Profa. Sylvia Maria Trusen (UFPA – PUC/RJ)
Profa. Sylvia Maria Trusen (UFPA - PUC/RJ) Marienkind, ou do veto à Língua
Pós-Grad. Andréa Lívia de Souza Zierer (UFF) A Imagem da “Mãe Má” no conto Branca de Neve, dos Irmãos Grimm
Grad. Daniel Rodrigues de Castro (UFRJ) As influências do compositor alemão Richard Wagner na obra do poeta nicaragüense Rubén Darío: a busca de uma nova poesia através da ópera Lohengrin (1847) e do poema El Cisne de Prosas profanas (1896)

12:15 - 13:15h Sessão de Comunicações Germânicas IV - Germanos e Escandinavos: Identidade Cultural - Coordenador Prof. Dr. Johnni Langer (FACIPAL)
Grad. Everton Schwartz da Silva (FACIPAL) A construção da imagem dos povos germânicos
Grad. Jonas Mamlak (FACIPAL) A imagem dos guerreiros germânicos no imaginário contemporâneo
Grad. Wanilton Tadeu Dudek (FAFI) Temor viking: teorias da expansão escandinava durante a Idade Média

QUARTA-FEIRA, 01 DE SETEMBRO DE 2004

08:00 às 09:00 h: Mini-Cursos

09:00 - 09:15h: Intervalo

09:15-10:15h Conferência plenária III - Da "Germania" à península Hispânica: Aspectos do deslocamento, do assentamento e do poder na trajetória dos germanos - Profa. Dra. Leila Rodrigues da Silva (UFRJ)

10:15 -10:30h: Intervalo

10:30 - 12:00h: Painel - A estrutura nominal alemã em textos da história celta

Coordenadoras:
Profa. Dra. Maria José Monteiro (UFRJ)
Profa. Me. Sílvia D. Boger de Melo (UFRJ)

Autores (Graduandos UFRJ/FL):
Robson Carapeto
Fernanda Teleska Kerkhoff
Danielle Lima
Fellipe Carauta


10:30 a 10:45 - Mesa Redonda IV - Celtas e Germanos: História e Ficção - Coordenadora Prof. Me. Adriana Zierer (UEMA)
Profa. Me. Adriana Zierer (UEMA) - Artur: de guerreiro mítico a rei-perfeito
Prof. Dr. Ricardo da Costa (UFES) O Conto do Graal (c. 1178-1181) de Chrétien de Troyes e sua mitologia céltica
Orlando Paes Filho (Escritor) - Angus, o Primeiro Guerreiro: um exemplo de narrativa de ficção no contexto das Ilhas Britãnicas no século IX


12:00 -12:15h - Intervalo

12:15-13:15h: Sessão de Comunicações Celtas III - Celtas: entre os mitos e a História - Coordenadora: Profa. Assunção Medeiros (UCAM)
Profa. Assunção Medeiros (UCAM/ESCM) Processo Tradutório da História Eclesiástica das Gentes dos Anglos: uma introdução à obra de São Beda
Grad. Cláudio Quintino (escritor e representante da Druid Network) Resgatando os mitos Celtas
Grad. Daniele Silva de Oliveira (UFRJ) O Mito De Deirdre e o Desvelar De Uma Sociedade

12:15-13:15h: Sessão de Comunicações Celtas IV - Estudos de cultura celta: da Antigüidade clássica ao século XIV Coordenadora: Profa. Me. Jeanne Cristina Menezes Crespo (UFF)
Profa. Me. Jeanne Cristina Menezes Crespo (UFF) Celtiberos e Iberos: um estudo comparado acerca das representações nos textos clássicos e dos indícios arqueológicos
Graduado Ronaldo Salotto da Silveira (FACHA) – O princípio do entrelaçado na estética celta
Grad. Rafael de Abreu e Souza (UNICAMP) Druidas e Soldados - uma revolta ‘celta’ no primeiro século cristão: novas abordagens ao estudo da Revolta de Boudica
Grad. Bruno Costa Oliveira (UFES) A relação de soberania entre a Irlanda e o País de Gales no segundo ramo do Mabinogion: Branwen, filha de Llyr

12:15 - 13:15h Sessão de Comunicações Germânicas V - Temas de Cultura Germânica: o mundo viking e a Inglaterra do século XI - Coordenadora Profa. Me. Ana Denise Fagundes Lacerda (PUCRS)
Profa. Me. Ana Denise Fagundes lacerda (PUCRS) Uma re-edição do Recitudines Singularum personarum
Grad. Beatriz Ramos da Costa (UERJ) Santo Olavo – a luta contra a antiga fé

12:15 - 13:15h Sessão de Comunicações Germânicas VI - O mundo germânico-celta e a literatura medieval: fronteiras histórico-literárias - Coordenador Grad. Diego de F. B. Pereira (UFRJ)
Grad. Diego de F. B. Pereira (UFRJ) Manifestação do mundo anglo-saxão em Beowulf
Grad. Ana Gabriela Antunes Ribeiro (UNESP/Araraquara) Do vaticínio ao grunhido – resquícios do mito dos gigantes nas narrativas populares escandinavas
Grad. Rubens Malcher Froes (IFCS/UFRJ) Bardos e skalds: a tradição oral da narrativa entre os povos celtas e vikings

QUINTA-FEIRA, 02 DE SETEMBRO DE 2004

8:00 às 09:00 h: Mini-Cursos

09:00 - 09:15h: Intervalo

09:15 - 10:15h conferência plenária IV - Mitos Arturianos - Prof. Dr. Antonio L. Furtado (PUC/RJ)

10:15 - 10:30h - Intervalo

A partir de 10.30h: Entrega dos certificados

10:30 -12:00h: Mesa Redonda V - Religiosidades Germânicas: perspectivas historiográficas e literárias
Prof. Dr. Ciro Flammarion Cardoso (UFF): Teoria e metodologia para o estudo das religiões germânicas da Antiguidade e da Alta Idade Média
Prof. Dr. Johnni Langer (FACIPAL): A historiografia das religiões Vikings, De Rudolph Keyser (1854) a Neil S. Price (2003).
Prof. Dr. Álvaro Alfredo Bragança Jr. (UFRJ): Cristianismo e Paganismo nas fórmulas mágicas em antigo-alto-alemão: para uma discussão histórico-lingüística.

12:00 -12:15h - Intervalo

12:15-13:15h: Sessão de Comunicações Celtas V - Traços do mundo mágico celta na literatura contemporânea -Coordenadora: Profa. Dra. Shirley de Souza Gomes Carreira (UNIGRANRIO)
Profa. Dra. Shirley de Souza Gomes Carreira (UNIGRANRIO) A apropriação do mito de Ceridwen em As Brumas de Avalon, de Marion Zimmer Bradley
Prof. Dr. Afrânio da Silva Garcia (UERJ-UNESA)A imagística do desejo e da sua interdição nas lendas do rei Artur
Prof. Dr. Tatiana Alves Soares Caldas (UNESA/UniverCidade) Entre a Deusa e a Bruxa: reflexões sobre o imaginário pagão em Agustina Bessa-Luís

13:30h: Coquetel de Encerramento

5.8.04



Amor a seus pés



As pessoas falam em muitos tipos de amor. Eu não acredito nisto, sempre achei que amor fosse uma coisa só. E amor não acaba. Amor é perene. Tem uma pessoa que eu sei que sempre vou amar, apesar de não estarmos mais juntos faz algum tempo. Esta pessoa agora está num momento de sofrimento. Pois apesar da minha vontade ser me jogar aos pés desta pessoa e pedir para sofrer no seu lugar, o bom senso prevalece e eu sei que ele precisa do treinamento, duro o quanto seja. Amado, não fique triste, as coisas começam e acabam, e renascem em outro lugar. Descanse um pouco, respire fundo e siga adiante.

A música, como eu disse, é para você. Te amo muito.


As the world falls down
David Bowie

There’s such a sad love
Deep in your eyes, a kind of pale jewel
Open and closed within your eyes
I'll place the sky within your eyes
There's such a fooled heart
Beating so fast in search of new dreams
A love that will last within your heart
I'll place the moon within your heart

As the pain sweeps through
Makes no sense for you
Every thrill has gone
Wasn't too much fun at all
But I'll be there for you
As the world falls down
Falling
falling down
Falling in love

I'll paint you mornings of gold
I'll spin you valentine evenings
Though we're strangers till now
We're choosing the path between the stars
I'll leave my love between the stars

As the pain sweeps through
Makes no sense for you
Every thrill has gone
Wasn't too much fun at all
But I'll be there for you
As the world falls down

Falling
As the world falls down

30.7.04

Resposta ao Milton




Querido Milton,

Seus comentários no Asa estão merecendo um post-resposta. Aqui vai!

Primeiro, meu amigo, obrigada pelas sempre gentis palavras a respeito da qualidade dos textos. Eu ficaria envergonhada de me aproximar da Mônica Salmaso, mesmo virtualmente, e dizer "ei, veja o que eu escrevi procê"!... portanto, se você acha que vale a pena, faça-o você mesmo, meu caro amigo gaudério.

Segundo, para aqueles que ainda não sabem, este é o FLIP-famous Milton Ribeiro, o blogueiro que beijou Mônica Salmaso e que fez Miguel Souza Tavares explodir em sonoras gargalhadas. Vão ler o blog do moço, é um primor, e tem link aí na coluna ao lado. Não vou citar todas as FLIP-façanhas dele que testemunhei, porque sei que é uma criatura modesta. Mas já estou aqui a matutar se na próxima FLIP ele usará um uniforme e um cinturão FLIP de utilidades... Santa Literatura, Milton!

Por último, querido amigo, que bom que gostou do layout novo do Asa, mas para esclarecer uma sombra de dúvida que pairou no ar a respeito da cor azul, amo o azul por causa do céu de outono do Rio, amo o azul por causa da borboleta-azul, que um dia um amigo usou como vocativo carinhoso, amo o azul por causa do mar de Fernando de Noronha... mas só há um time gaúcho que faz meu coração bater acelerado, e o sangue -- rubro -- correr forte nas veias. Neste time nada há de azul, muito menos de azul-pijaminha!

Junto com o Milton, torço pelo time mais vermelho e maravilhoso que há:Internacional Sport Clube!



29.7.04

Do poeta Jorge de Lima, no seu livro A Túnica Inconsúltil, lanço o poema como uma semente ao vento. Deus permita que esta semente germine no lodo do coração de alguns.;

O Ventríloquo


Debruça-te sobre tua voz para escutá-la:
tua voz existiu antes de tua forma.
Se o alarido do mundo não te permite entendê-la,
vai para o deserto,
e então a ouvirás com a inflexão inicial das palavras do Verbo
e com a fecundidade do Gênese ante o Fiat do Pai.
Ouve tua voz sobre a montanha para que o divino eco
atravesse os milênios
e reboe dentro de ti que és o templo de Deus!
Na tua voz adulta ainda existe o acalanto de tua ama
e o balanço de teu berço.
Ainda há apelos que vêm da alcova de teus pais,
ainda há os convites do instinto de tua juventude.
Debruça-te sobre tua voz e escuta as vozes que vêm nela,
as ressonâncias de ti próprio que nasceram contigo,
os bramidos dos ventos nas tuas velas rôtas,
a risada do diabo diante de teus desastres.
Ouve tua voz sobre o dorso do mar
onde ela flutuou no começo das coisas
e a água a concebeu e se tornou fecunda.
Ouve a tua voz entre as massas humanas
que como o mar se tornarão fecundas
e espalharão a palavra do Livro
pelas águas e pelos continentes.

28.7.04

Casa Nova



Queridos amigos, espero que gostem do Asa de Borboleta ano 3... foi uma caprichosa construção de meu talentoso amigo Bruno Trezena, que já tinha feito uma alteração no template do Asa, e agora preparou o Template definitivo, muito lindo e azul do jeito que gosto.

Ele é um jovem candidato a supermegawebdesigner, e o link dele está junto do blogger, nos créditos... (o "Cuméquié?") Quem estiver interessado em construir um blog novo, ou pensando em modificar o antigo, chamem o garoto que ele é bom.

Eu estou feliz feito criança em dia de Natal, abrindo pacotes de presente. E vem mais coisa bonita por aí!

Beijos de Borboleta

23.7.04

Filhos



O texto, como podem ver, não é meu. Recebi de um querido amigo, por e-mail, o link para a página onde originalmente foi publicado na íntegra.

Gostaria de ter escrito sobre um filho que tive, principalmente um texto lindo assim, mas nunca tive este privilégio de gestar. Ao ler este texto, minha reação primeira foi me afogar em lágrimas, porque perder um filho, ou não ter um filho, é sempre motivo de grande dor. Mas o texto é tão simples e firme na sua esperança, que acabei chorando e sorrindo ao mesmo tempo.

As coisas são simples assim, mesmo: ou se ama, ou não; ou se acredita que a vida é precioso dom de Deus, ou que a lei da selva prevaleça. Afinal de contas, se tudo é um acidente, que diferença faz a moral? Que diferença faz qualquer coisa?

Não, não estou e jamais fui niilista. Muito pelo contrário, tudo e todos à minha volta são tão preciosos que eu às vezes perco o fôlego. Ou choro feito uma boba.

Escrevi um texto no dia cinco de outubro do ano passado que tenho um filho. Escrevi com todo o coração o quanto amo este filho. Mas agora, descobri um texto de uma mãe que descreve com mais força o que é este amor, numa situação ainda mais dramática. Transcrevo então trechos do texto abaixo, e o dedico a meu filho Alex.



Querido Vítor

Você não sabe como ultimamente tenho me lembrado de você. Sabe porquê? Anda em voga o assunto de se permitir o aborto em caso de anencefalia, como foi o seu, lembra-se? Você não pode imaginar as barbaridades que mamãe tem escutado de pessoas grandes, não no sentido de grandes de coração, alma e inteligência, mas só por que são bem maiores do que você era quando esteve em meu ventre por nove meses, no entanto parecem não saber de nada.

Lembra-se daquela tarde, logo depois de mamãe sair da casa do vovô Inaldo quando foi fazer a primeira ultra-sonografia, no 3° mês de gestação? Estava tão tranqüila afinal quantas e quantas ultras mamãe já havia feito quando esperava os seus irmãos, Gabriel, Marcus e Raquel. Lembro-me como se fosse hoje, deitada na cama, o médico fazendo a ultra quando, de repente, me fez aquela pergunta: - É o seu primeiro filho? Logo respondi com toda a tranqüilidade - Não. É o quarto, por quê? Vi que demorava a responder e percebi que havia algum problema com você. Indaguei novamente: - Por quê? Está tudo bem com meu filho? O que ele tem?

A resposta foi seca e dura, como alguns médicos, ainda bem que nem todos, costumam tratar dessa forma a doença dos outros. Respondeu-me: - O seu filho tem um problema, não tem cérebro. Lembro-me de que comecei a chorar e perguntei a ele, na inocência de obter uma resposta científica: - O que vou fazer agora? E mais uma vez veio a frieza que na hora a mamãe não conseguiu captar, veio aquela resposta fria: - O seu médico sabe o que você tem que fazer! Perdoe-me, filho, por não ter dado uma resposta dura e clara ao médico naquele momento, mas a mamãe não conseguiu naquele instante captar a malícia do que ele queria dizer. Com certeza queria que eu te matasse.

Passei a te amar mais ainda nos dias que se passaram, por que fui entendendo coisas que até então não sabia. Conversei com o obstetra e ele então me explicou como seria essa "gestação especial". Enquanto estivesse comigo, dentro de mim, você estaria seguro, tranqüilo. Hoje entendo por que você não precisava de uma nova contribuição da mamãe para "ser", você já existia, já era um ser humano existente, já era meu filho. Você só precisava crescer, suas próximas fases seriam de autocrescimento, de desenvolver o que você já "era". Nos próximos meses a única coisa que mamãe teria de fazer e que você precisava como qualquer criança era de nutrição, oxigênio e o tempo. O seu tempo.

Você sabe o quanto foi difícil, saber que não te teria nos meus braços por muito tempo depois que você nascesse. Mas logo resolvi a questão, perguntei ao médico qual o máximo de tempo que poderia ter você em mim, e ele respondeu de 38 a 40 semanas. Logo eu tinha pelo menos 38 semanas para estar muito perto de você, te amando. Lembra-se dos beijinhos que o papai, o Gabriel, o Marcos e a Rachel davam na minha barriga para você? Lembra-se de nós todos rezando todas as noites pedindo para você ficar "bom do dodói", pois era assim que eu explicava para os seus irmãos o seu problema. E foi assim que os dias se passaram e no lugar da tristeza, entrou a alegria de ter você perto de nós, pelo tempo que Deus quisesse e fomos muito felizes.

Lembra-se filho quando mensalmente mamãe ia ao médico, para acompanhar a sua gestação e eu escutava o seu coração batendo forte dentro de mim? (140 batidas/minutos). E o quanto era bom saber que você estava ali. Não podia eu dizer que você era uma parte minha, pois desde a concepção você já existia com um código geneticamente diferenciado, original em relação ao meu. Como podem algumas pessoas dispor do que não lhes pertence?

E o tempo foi passando não é, filho, e aquele ser pequeno que existia em mim, já estava grande e pronto para nascer. Lembra-se que mamãe também sofreu muito quando estava chegando o dia do parto? É que eu sabia que o tempo de ficarmos juntos agora se tornava mais curto, não ficaríamos mais tão próximos como estávamos. Você tinha que nascer e seguir o seu caminho, o caminho que Deus-Pai havia traçado para você desde toda a eternidade. Nunca chorei de revolta, você sabe disso. Chorava de saudade, a mesma saudade que a mãe sente quando o filho se casa e vai embora, era a saudade natural de rompermos os laços com os filhos, às vezes mais cedo, outras mais tarde. Mas, nós seres humanos não somos, por mais que estejamos tentando ser, "Aquele que é". Somente Deus é Aquele que é - só Ele pode dar o ser a outros e somente Ele pode tirar a existência desse ser, fazendo sua história mais curta ou mais longa, mas todos fazemos história e ninguém tem o direito de interromper a história de vida de outra pessoa.

Você fez a sua história de Vida, fez a nossa história de vida, você até hoje é lembrado pelos seus irmãos. Sabia que muitas vezes a Raquel com apenas três aninhos, me perguntava quem tomava conta de você no céu? E aquela outra vez que estávamos eu e seus irmãos esperando em frente ao prédio onde morávamos a Kombi Escolar do seu Júlio, dias depois que você faleceu e o Gabriel com apenas quatro aninhos estava perto de mim, junto com a Raquel e o Marcos. De repente surge um senhor e me pergunta: - São seus filhos? - Sim, respondi. E ele novamente perguntou: - Você tem três filhos?: - São todos seus? - Sim respondi, tenho três filhos. O senhor foi embora, afinal era só curiosidade. Mas o seu irmão Gabriel olhou para mim e disse: - Por que você mentiu para ele? Na hora não entendi o que o seu irmão tão pequeno queria dizer e resolvi perguntar por que eu havia mentido para aquele senhor. Foi quando ele disse com toda a naturalidade e sentimento de família: - Você não tem três filhos, você tem quatro, por acaso esqueceu do Vitor que está no Céu?

Confesso que fiquei desconcertada naquele momento, pois é evidente que não havia esquecido você, afinal tinha poucos dias que você havia nos deixado. Tentei explicar a ele por que havia dado aquela resposta ao senhor, por que havia dito três ao invés de quatro, expliquei-lhe que a mamãe não havia mentido, apenas se reservado, afinal se dissesse quatro filhos, ele perguntaria onde ele estava e eu teria que falar toda a história para alguém que não conhecia. E assim expliquei ao Gabriel que às vezes devemos manter nossa privacidade. Mas ao mesmo tempo, depois daquele questionamento aprendi uma lição. Aprendi que seus irmãos tinham em você alguém muito presente, alguém que fazia parte daquela família, mesmo não estando ali entre nós e passei a dar a resposta que ele queria quando me perguntavam quantos filhos eu tinha. Dizia: - Tenho quatro, um faleceu. Hoje eu digo: - Tenho seis, um faleceu, pois após você vieram a Catarina e a Maria Teresa. Pronto estava resolvido o que incomodava o seu irmão. E ele, seu irmão, estava certo com apenas quatro anos de idade, porque você Vitor não era alguém que tinha passado pelas nossas vidas, você fazia parte dela, você era um pedaço de nossa história e eu não tinha que te esconder. Mas você sabe que nenhum de nós jamais te esqueceu.

E eis que chegou o grande dia. Era o dia de você nascer, mamãe e papai foram juntos para o hospital às 21:00 horas. Enquanto esperávamos os médicos chorávamos muito os dois, porque sabíamos que estava próximo a nossa separação. Mas você, já sabia que mamãe havia preparado o melhor para você durante os nove meses em que estivemos juntos, escolheu todos os médicos que iriam te dar todo o carinho que você precisaria e que eu não poderia dar naquele momento. Conversei com Dr. Dernival para que batizasse você ainda na sala de parto, eu queria te dar tudo que uma mãe quer para um filho, a Eternidade. Um pouco antes de entrar no Centro Cirúrgico ele ainda me perguntou: - Como ele se chamará? - Vítor, respondi com firmeza, vindo depois, a saber, que o seu nome significava "aquele que venceu" e você venceu mesmo!

Chorei muito quando recebi a notícia no dia seguinte pela manhã, pois você havia nascido às 23:50 hs e eu estava sedada, mas lembro-me que mesmo sonolenta perguntei ao Dr. Fernando (seu neonatologista), pessoa tão especial e humana, como você estava e apaguei ouvindo ao longe a resposta que você não estava muito bem. Doce Dr. Fernando quis poupar-me, você já havia morrido e ele havia ficado os 40 minutos de sua vida de mãos dadas com você, não te deixou sozinho nem um instante. O dia seguinte, ainda sem saber que você já era mais um anjo no céu, seu pai não me dava a notícia, pois o médico, havia pedido para que retardasse a mesma. E eu inocente via o seu pai chorar no quarto e brigava com ele para que fosse ver como você estava passando, ele simplesmente levantava da cadeira chorando, sem nada me dizer.

A notícia de sua morte me foi dada por um grande amigo nosso, sacerdote. Amigo de todas as horas difíceis de nossa vida, aquela pessoa que quando morrer, mesmo sem ser conhecida por todos, a Terra ficará diminuída porque a humanidade toda sentirá o peso de sua partida, assim como foi com Madre Teresa de Calcutá, assim como será com João Paulo II. São seres tão especiais que a morte deles nos diminui um pouco e nos faz refletir o quanto temos de trabalhar e fazer pela humanidade. Mas até nisso Deus pensou em mim, em quem me daria a notícia que iria doer tanto. Chorei muito, como nunca havia chorado antes na vida, era uma dor que não passava, parecia roer os meus ossos, o meu coração parecia que estava sendo arrancado do meu peito. Lembro-me e jamais esquecerei que num segundo fui inundada por uma paz interior, que jamais havia sentido antes, era um carinho de Deus pelo dever cumprido, quase um "consumatum est". Havíamos cumprido a nossa função de deixarmos você fazer a sua história e parte de nossa história.

E algumas horas depois recebi autorização do médico para numa cadeira de rodas, descer até a capela do hospital para dar o meu beijo em você, aquele que eu tanto esperava. Peguei-te nos meus braços e olhei com detalhes para você já de toquinha na cabeça. Era lindo demais. Seu nariz, sua boquinha, seus olhos, suas orelhinhas, suas mãos tão pequenas e delicadas, sua unha tão pequenina, era perfeito. É um momento que jamais vou esquecer. Dei-te um beijo suave na testa enquanto a lágrima corria, como corre agora, neste momento em que relembro o passado, e vejo de uma forma viva e clara o seu rosto sereno, angelical, porque você já estava no céu. Essa certeza eu tinha, pois você havia recebido o sacramento do Batismo antes de morrer. E não demorei muito ali porque todo o meu amor e carinho de mãe e de ser humano eu tinha te dado enquanto você esteve vivo no meu ventre, fazendo-me te amar a cada dia e respeitar você.

Vítor, meu filho, como você nos ensinou durante os nove meses que sofrimento não mata, mas ensina e faz crescer, nos torna mais gente e humano. Como sou grata a você por ter tido a chance de viver essa história, de ser forte porque você estava comigo. E como todo cidadão que nasce, também perante a sociedade que cobra atitudes tão contraditórias, você teve sua certidão de nascimento e certidão de óbito, porque respirou 40 minutos após nascer. E porque fez parte da história não só da nossa família, mas de toda a humanidade, você ganhou até um poema do vovô Inaldo, poema este publicado no livro de Outonos, em 2001 intitulado Elegia para o neto efêmero - Vítor Alonso Guimarães, poema suave e profundo como sua história de vida.

Sabe Vítor, li certa vez em um livro, em que um pai escrevia cartas para uma filha portadora da síndrome de Down, uma coisa muito bonita. Ele dizia que "Umas almas encarnam em corpos defeituosos que têm de viver com problemas mais ou menos visíveis e algumas até se alojam em seres com cérebros malformados, que limitam, como montanhas intransponíveis, os seus meios de expressão. Mas estas últimas são tão perfeitas quanto as outras almas, e o seu Anjo da Guarda recebeu uma missão mais importante do que a dos anjos restantes: não só deve tutelá-las constantemente, mas também proceder inicialmente a uma seleção dos pais que hão de ser, dia após dia, seus colaboradores para ajudar esse filho a realizar ações prejudicadas pela sua incapacidade". E é assim que me sinto com relação a você, uma privilegiada por ter sido escolhida para ser mãe de uma criança como você, que mesmo que vivendo tão pouco ensinou tanto para mim, para seu pai e seus irmãos.

Não gosto quando me chamam de heroína por ter levado a sua gestação até o fim, as mães que assim procedem não são heroínas, são só mães. A cada dia a ciência avança, descobre novidades, e aquilo que há alguns anos era perigo de vida para as mães, hoje são facilmente resolvidos face aos avanços de conhecimento gerais, científicos e tecnológicos. Acho que haverá um dia em que casos como o seu exigirão lutar pela vida e não pela morte. Os médicos falam que embora muito se saiba hoje sobre o cérebro, muito mais ainda tem que se saber, ainda há muito por descobrir.

Enganam-se aqueles que acham que nascido o feto, completo e perfeito tudo deu certo. O homem nunca está terminado, nesse momento deverá começar uma nova luta mais difícil e sofrida do que a de uma gravidez como da mamãe. É a tarefa de fazer este ser pequenino que nasceu, transformar-se num homem de verdade, num ser capaz de contribuir para uma sociedade justa, em defesa da vida, em defesa da verdade. E com certeza enquanto os homens julgarem-se no direito de dizer quem deve morrer, quem deve viver e quando isso se dará estaremos longe de sermos uma sociedade justa e muito menos humana.

Querido Vítor, acho que está na hora de terminarmos esta nossa conversa, afinal, você conhece a mamãe, ela fala demais. Meu anjinho, não se preocupe com as notícias que te dei, assim como existem pessoas fracas, intransigentes, existem pessoas cheias de amor de Deus no coração e essas pessoas estão sempre juntas para defender e esclarecer aos que se acham donos do bem e do mal, o quanto vocês seres tão pequeninos são seres humanos únicos e irrepetíveis. Você sim, não tem mais o que aprender, já conheceu todos os mistérios de Deus, já entendeu o porquê de sua história, por ter sido curta e ao mesmo tempo tão grandiosa.

E não se preocupe com as lágrimas que mamãe e papai derramaram, consolei-me quando li em um livro de Antônio Orozco, OS TRÊS SÓIS: a Sagrada Família - Editora Quadrante, que dizia: "às vezes, encontramo-nos mergulhados num mar de lágrimas... E o mar absorve-as, sem que consigam enchê-lo. Parece que se perdem inúteis, estéreis, estúpidas. Mas não. Todas as lágrimas vão parar no coração de Deus-Pai...".

Um beijo da mamãe.
Ana Lúcia

18.7.04

Profundo amor


Só olhar teu corpo largado sobre a cama , e já me enche o desejo de te tocar, mas o repouso absoluto e entregue, a respiração lenta e solta dos inocentes, faz com que eu não ouse perturbar tamanha tranquilidade com meu toque. Prefiro esperar que tu me procures, com um leve despertar, que encoste teu corpo quente e macio no meu. O suspiro profundo com que retornas ao teu mundo de sonhos - o que será que sonhas?- assegura meu coração incrédulo que teu lugar é aqui.

Não cesso de maravilhar com o fato de que tu me escolheste, ó ser de intensa beleza e dignidade. Não sei que bem fiz para merecer teu amor. Não é o amor fácil e risonho dos felizes; teu amor por mim é feito de olhares furtivos que só tu e eu entendemos. Teus gestos de afeto são contidos como os de todos que já sofreram.

Entretanto, nunca duvido da grandeza de teu amor. Sempre é com o coração transbordante que vejo a tua alegria com qualquer retorno meu à casa, uma explosão de felicidade que tem tão pouco em comum com o restante de teus gestos reservados. É com crescente gratidão que vejo você lentamente adoçar o temperamento, percebo que não és mais a criatura arredia que entrou na minha vida.

O meu amor por ti é tão grande que me custa lembrar que não consegues receber bem manifestações por demais efusivas de afeto; que contigo a sutileza e a delicadeza são ingredientes importantes da convivência diária. No entanto, é justamente esta contenção que me ensinas, gata amada, me ensinas a ser leve e delicada no trato, a entender naturezas diferentes da minha, a cuidar de não passar dos limites do outro. Ser tua tem sido um aprendizado de afeto.

É espantoso para mim escutar pessoas em toda a parte que gatos são animais pouco afetuosos e distantes. Os tolos que falam tal coisa provavelmente nunca viram com o eles podem, num piscar de olhos, sair de uma posição estática e cheia de fleuma e zunir pela casa como bólidos; parar tão abruptamente quanto começaram, porque PRECISAM pentear aquela areazinha exata do pêlo que estava fora do lugar; e, de queda, se você deixar, lambem seu pêlo também.

Quem não tem gato não sabe. Eles são barômetros de sentimentos. Quem tem um gato em casa e o observa com cuidado, aprenderá logo a detectar a situação emocional do ambiente pelo comportamento de seu felino. Ao observar minha linda Pompom ficar cada dia mais tranquila e feliz, só posso levantar os olhos para o Céu, sorrir e dizer: obrigada.




17.7.04




Que nome tem isso



Eu pensei muito antes de escrever este texto. Primeiro, porque não sabia que título dar a ele. Pensei em chamá-lo de "Música e Magia", mas além da irritante obviedade, este pobre título não é descritivo o suficiente para a experiência que foi escutar pela primeira vez aquela voz. Na verdade, "voz" também não preenche totalmente de som e significado o inprint que a presença daquela artista fez em minha alma. É... presença talvez seja a melhor palavra.

A música era boa, a voz perfeita, o violão excepcional, mas, mais que um concerto de alto gabarito técnico, o show de Monica Salmaso e Paulo Bellinati foi a expressão musical de toda uma felicidade que nós sentíamos de estar ali. Não apenas nosso pequeno grupo - que compartilhava do exíguo espaço dentro do café Paraty com centenas de outras pessoas, por obra, graça e bendito oportunismo do já lendário Milton Ribeiro -, também havia uma pequena multidão de ouvintes embevecidos, parados, em pé, no meio da rua.

Era tanta a concentração, e o respeitoso silêncio era tanto, que em determinada parte do show a cantora, encantada, virou-se para o lado de fora do café e comentou: "Vocês estão tão bonitinhos com suas carinhas aí na janela..."

Estava tudo mais que bonitinho, estava lindo. Paulo Bellinati tirava sons inacreditavelmente puros de seu violão. Monica esbanjava capacidade vocal e afetiva em iguais proporções. Findo o concerto, continuado o afeto, distribuído equitativamente entre todos os que permaneciam no estabelecimento. Quase ninguém, na verdade, havia saído - não só por falta de vontade, ma por uma certa dificuldade em fazê-lo, devido ao aguaceiro que caía.

Recebi, eu também, o beijo e o carinhoso abraço que deixou o amigo Milton em estado de graça. Recebi bem mais: da insistência de Milton, recebi o presente de um beleza inesperada; da voz e do violão, recebi o enlevo e a maravilha que só vêm da verdadeira arte; observando o brilho intenso nos olhares de meus amigos, reaprendi a força da experiência compartilhada.

Ganhei, então, o presente maior dos laços de amizade reforçados pela lembrança comum, o carinho aprofundado pela nova memória que construímos juntos. Foi assim durante todo o evento. Hoje, Paraty já distante, a FLIP mais que encerrada em 2004,  tenho a um click de distância vozes amigas que, ao serem lidas, trazem consigo um leve dedilhado de violão e um cristalino vocalize que ressoa dentro do coração.